Para os que acompanham este blog, é obvio que me nutro desses sobressaltos do quotidiano que de forma inesperada esbarram em cheio por entre as rotinas automáticas do dia-a-dia, monopolizando os sentidos, enriquecendo-me o espirito e mantendo-me conectado ao que me rodeia e que realmente interessa.
Obviamente todos temos os nossos filtros e eu sou especialmente sensível a estímulos visuais, sobretudo, se tiverem como elemento principal - cultura de surf.
E nisto num destes dias, sem dar muito bem por isso, entre um assunto e outro, uma espera e uma curta conversa, um cumprimento e uma combinação, dou por mim com um bonito portfólio, em capa dura muito simples, com o título: "Godard Essentials".
A natureza da situação, em que tal aconteceu, não permitiu que explorasse com a merecida atenção esta publicação, estéticamente agradável, da autoria de Josep Maria Jodar i Godard . Contudo, embora o momentâneo contacto, tinha sido o suficiente para que a minha curiosidade e interesse, sobre o que aquelas páginas revelavam, não tivesse sido demais desviada.
Tinha que conhecer, saber do que se tratava, contemplar o trabalho e formular uma opinião...
Na verdade, a sensação imediata que tive foi despertada pela intensa luz que as pinturas ali representadas possuíam. À obra de Godard pode atribuir-se à primeira vista um carácter casuístico e simplista, que remete para um tipo de fotografia amadora, cuja composição é banal. No entanto, as pinturas a óleo de Godard, apesar de reflectirem um quotidiano estival que é próximo ao autor: paisagens e imagens da realidade balnear da sua região a Costa de Maresme na Catalunha, revelam uma transformação complexa desse espaço com profundas influências da cultura de surf Californiana. Na verdade, ao ver estes quadros o observador questiona-se relativamente ao espaço e ao tempo da imagem. As praias, as estradas, as paisagens e a luz, podem de repente ser de uma Califórnia dos anos 60 e 70.
"Surf Diumenge" - Óleo sobre tela - 31,5 x 21 cm
Respira-se Grannis na pintura de Godard, na forma como capta o surf e a sua vivência, e sobretudo no imaginário que se constroi, que se sobrepõe convictamente à realidade ali expressa. Para tal efeito contribui o perfeito domínio das cores, dos jogos de luz e de sombras, os fortes contrastes, a distribuição de zonas nítidas contrastando com a luz ofoscante de outras zonas e, em último plano, a composição equilibrada, sem elementos superfluos e acessórios.
Tudo nas suas obras é essêncial e essência.
O resultado é um trabalho apelativo que espraia o espírito do observador e transporta-o pelas referências culturais e históricas do surf.
Godard surpreende, pela intimidade e maturidade cultural surfística e pela sede de surf como conceito abrangente. É que, na verdade, a Costa de Maresme está longe de ser uma meca do surf...
Essêncial Godard, porque prova mais uma vez que surf é muito mais do que o simples acto de surfar.
Imagens retiradas do blog: josepmariajodar.blogspot.com